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Poeta sertaneja Severina Branca vira música do cantor pernambucano PC Silva


 A poeta quase octogenária Severina Branca, personagem grafada na paisagem cultural do Sertão pernambucano, embala o novo single do cantor e compositor PC Silva, conterrâneo e admirador da obra da mestra. A música “A Flor das Algarobas” já está disponível nas plataformas de streaming, como uma homenagem à artista do Serrote Pintado, lugarejo na zona rural de São José do Egito.

A composição, parceria com Juliano Holanda é a segunda tornada pública do novo álbum, batizado de “Me Dê Notícias do Universo” e com estreia programada para o mês de outubro. PC lançou, dias atrás, “Beira de Mar”, uma incursão sonora apocalíptica por uma distopia futurista do planeta arrasado por catástrofe climática. O tributo a Severina Branca dissolveu, segundo o cantor, uma sensação de incompletude em relação à lista final das músicas selecionadas para o disco; quando “A Flor das Algarobas" entrou, o cantor e compositor percebeu o material todo enquanto um produto artístico pronto para degustação do público.

PC Silva colore a homenagem sonora com a sutileza, a candura e a fortaleza evocadas pelas poesias de Severina Branca, poeta sem oportunidade de educação formal e construída pela habilidade de transpor para as palavras as vivências e agruras do cotidiano sertanejo. Cercada pelos versos desde a infância, ela desenvolveu habilidade poética própria baseada na cultura oral e garimpou inspiração em amores, saudades, perdas, tradições, decepções e sofrimentos no dia a dia e nos cabarés frequentados na sua juventude boêmia. 

Severina é conhecida pelo uso do mote (verso duplo e repetitivo balizador do poema inteiro) autobiográfico “O silêncio da noite é que tem sido / Testemunha das minhas amarguras”, já tomado emprestado como título no documentário sobre poetas locais assinado pelo cineasta Petrônio Lorena. Em “A Flor das Algarobas”, a letra de PC Silva sob melodia de Juliano Holanda faz uma alusão elogiosa à homenageada com base na passagem icônica. “Nomes e cores / Dores e amores / Poeta fêmea / Serás e foste / Mais que o silêncio é / Poeta fêmea”. 

A canção passeia por construções subjetivas e descrições poéticas sobre a vida, a obra e a essência da mulher Severina, com exaltação da coragem, da delicadeza e das experiências - afetivas e carnais - compiladas por noites e anos. Ou “Luzir na mata / Fundo profundo / calor no vendaval”, como diz a letra debulhada exclusivamente sob voz e violão para harmonizar com a simplicidade das poesias criadas por Severina.

“A Flor das Algarobas” se inspira e remonta a duas canções conhecidas pela exaltação contundente de personagens marcantes. “Giulietta Masina”, de Caetano Veloso, criada em homenagem à atriz italiana habitué de filmes dirigidos pelo cineasta Federico Fellini, e “Eleanor Rigby”, de Paul McCartney e John Lennon, sobre uma mulher marcada por juntar arroz após um casamento e um misterioso Padre McKenzie.

O tributo feito por PC Silva a Severina transcende a figura da poeta e lança um duplo olhar artístico sobre as nuances de uma região vocacionada para a cultura da palavra. Evidencia a força representativa da poesia para a afirmação, o reconhecimento, a emancipação e a constituição social, afetiva e identitária das mulheres oriundas de locais historicamente marcados pela prevalência de costumes masculinos. É igualmente significativo porque ilustra a importância e a resistência da oralidade, da tradição e da poesia enquanto elementos essenciais à formação da identidade, da produção artística e da inserção social. No sertão de Severina, a poesia tem vez e voz - e quem silencia é a noite.

Ouça AQUI .

A FLOR DAS ALGAROBAS

(PC Silva / Juliano Holanda)

Versos de prata

Peito de chumbo

Carmim de amor carnal

Flor de cor roxa

Bonina rosa

Dourado matinal


Nomes e cores

Dores e amores

Poeta fêmea

Serás e foste

Mais que o silêncio é

Poeta fêmea


Luzir na mata

Fundo profundo

Calor no vendaval

Marrom ameixa

Prazer da prosa

Noturno castiçal


Nomes e cores

Dores e amores

Poeta fêmea

Serás e foste

Mais que o silêncio é

Poeta fêmea


Irmã da solidão

E amiga de quem é

Sua pariceira

A noite vai trazer

Tecidos pra vestir

A flor das algarobas

(Severina Branca)

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