Para
marcar o dia nacional de combate ao trabalho escravo (28 de janeiro), o Ministério
Público do Trabalho (MPT) em Pernambuco divulga balanço dos resgates
feitos pelo órgão em 2012. Ao todo, 33 trabalhadores foram encontrados
em situação degradante, sendo 21 deles em engenho na mata sul do estado,
seis em obra da construção civil no Recife e outros seis em pedreira na
zona rural de Petrolina.
Na avaliação da procuradora do Trabalho, coordenadora do Núcleo de
Erradicação do Trabalho Escravo e Regularização do Trabalho Rural do MPT
no estado, Débora Tito, o número, aparentemente pequeno, pode ser
considerado elevado. “Ter 33 resgatados em um ano significa,
basicamente, que a cada 11 dias encontramos um trabalhador em condições
subumanas, o que é extremamente grave”, disse.
Este dado de 33 trabalhadores resgatados não inclui outras fiscalizações
feitas pelo órgão, em que foi verificado o trabalho degradante. De
acordo com Débora, é possível que haja a situação de violação, sem que
seja preciso recorrer ao instrumento do resgate. No fim do ano passado,
por exemplo, o MPT flagrou trabalho análogo ao de escravo em posto de
gasolina no Recife. Neste caso, inclusive, os trabalhadores eram
aliciados na cidade de Timbaúba, a 98 quilômetros da capital. Lá,
15 pessoas eram submetidas a condições degradantes.
Também não está incluída a investigação do MPT, em parceria com o Núcleo
Estadual de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, que investigou suposto
esquema de tráfico humano para o Bahrein, no Oriente Médio. A fraude
foi descoberta quando um grupo de 58 recifenses já estava com viagem
marcada, onde seriam contratados para trabalhar como cabeleireiros,
eletricistas, encanadores e ajudantes de serviços gerais. De acordo com a
Débora, um dos principais indícios do tráfico humano para fins de
trabalho escravo seriam, além dos valores da viagem, os cargos
oferecidos. "Geralmente as empresas que contratam trabalhadores de
outros países buscam engenheiros da construção civil, não cabeleireiros
ou auxiliares de limpeza."
Os
dados, na visão do MPT, evidenciam um novo perfil da escravidão
moderna: a precarização das relações de trabalho em novas atividades,
como no caso da construção civil, trazendo para as cidades um questão
que era inicialmente do campo. Em obras do setor, é possível flagrar
fraudes baseadas na 'quarteirização', 'quinteirização', por exemplo. Há
ainda a cada vez mais forte conjugação entre o tráfico de pessoas e o
trabalho escravo.
Na
opinião de Débora, a vunerabilidade ligada ao estado de pobreza ainda é
o maior condicionante para que o trabalho em condições análogas a de
escravo ocorra. "A prova disso, é que já restagamos um mesmo trabalhador
mais de uma vez. Ele já sabe que aquele trabalho não é bom, mas, por
necessidade, aceita e é explorado", disse.
Resumo dos resgates
1 - Engenho na mata sul – 21 trabalhadores
Em
inspeção feita conjuntamente entre o MPT e o Ministério do Trabalho e
Emprego, no Engenho Corriente, na zona rural de Água Preta, a 130
quilômetros do Recife. A ida ao local foi para verificar denúncia de
trabalho degradante. Informação comprovada in loco pelos auditores e
pela procuradora do Trabalho, Débora Tito.
O cenário, embora sempre seja chocante, é o típico das situações de
trabalho degradante/escravo, encontrado nas lavouras de cana de açúcar. “
Além de faltar água potável para beber, banheiros, equipamentos de
proteção individual, alojamento, pagamento de salário, os trabalhadores
não eram pagos em dinheiro e sim com vales de um mercadinho local,
caracterizando caso de servidão por dívida”, resume. “Ainda encontramos
dois adolescentes de 17 anos”, o que está proibido por lei para o tipo
de atividade.
Um mês após a fiscalização, para pôr fim às irregularidades, o MPT e MTE
firmaram dois Termos de Ajuste de Conduta (TAC) com o engenho. Um deles
é para proceder ao pagamento das verbas rescisórias – no importe de R$
241.456,38. Outro, mais amplo, que trata do programa de gestão de
segurança e saúde, do serviço especializado em segurança e saúde no
trabalho rural, do trabalho com agrotóxicos, dos equipamentos de
proteção individual, do transporte de trabalhadores, das instalações
sanitárias nas frentes de trabalho, das áreas de vivência, alojamentos,
locais para preparo das refeições e lavanderias, das despesas de
deslocamento, do fornecimento de água potável, da jornada de trabalho e
dos intervalos intrajornada, do trabalho de crianças e adolescentes, da
forma e do prazo do pagamento de salários e dos descontos salariais, da
garantia do piso salarial, das férias, do décimo terceiro, do FGTS.
2 – Obra da construção civil – 6 trabalhadores
Foi com a ideia de arrumar emprego em construção de grande porte que
seis trabalhadores, vindos do Paraná, Minas Gerais e Piauí, aceitaram
proposta de trabalho como operários em obras no Recife, arregimentados e
subordinados à empresa paranaense Mastel Montagem de Estruturas
Metálicas Ltda. A situação do trabalho, no entanto, não correspondeu nem
às expectativas nem à Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Após
receber denúncia dos operários, em que alegavam ser submetidos a
condições análogas a de escravos, e fiscalizar a construção, o
Ministério Público do Trabalho (MPT) em Pernambuco e a Superintendência
Regional do Trabalho e Emprego (SRTE) embargaram as obras do Shopping
RioMar e resgataram os trabalhadores da Mastel da situação.
“Embora nem todos os operários tenham sido encontrados em situação de
escravidão, o alerta surge para o aliciamento dos trabalhadores, que
ficaram presos ao trabalho por não ter condições de voltar para casa, e
para a precariedade dos alojamentos em que viviam”, disse a procuradora
do Trabalho Débora Tito, se referindo aos dois cômodos em que ficaram
alojados até 13 operários, dividindo colchões no chão, sem as mínimas
condições de higiene.
“Os empregados também estavam sem receber os salários e com a carteira
de trabalho retida na empresa, no Paraná”, afirmou. De acordo com o
depoimento do ex-funcionário assistente de montagem Renato Moreira de
Castro, os trabalhadores não tinham direito sequer a papel higiênico ou
água potável. “Era comum que ratos e baratas passassem pelos quartos”,
conta.
Além do embargo da obra e da interdição dos alojamentos, os documentos
relativos à contratação dos trabalhadores e à prestação de serviços
foram apreendidos. Os seis trabalhadores, após o recebimento das verbas
rescisórias e da guia de seguro-desemprego especial, voltaram aos
estados de origem.
3 – Pedreira em Petrolina - 6 trabalhadores
Após receber denúncia do Ministério Público Federal e do Ibama sobre
possível caso de trabalho degradante/escravo na zona rural de Petrolina,
Sertão do estado, o Ministério Público do Trabalho (MPT) em Pernambuco
realizou, em abril, inspeção conjunta com o Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE) e a Polícia Federal para averiguar a situação no local.
Como resultado, foram encontrados na empresa Pedreira Vitória seis
trabalhadores em condições degradantes de trabalho. Segundo o relatório
que detalha a inspeção, todos eles tinham algum vínculo de trabalho com a
Pedreira Vitória, apesar de não serem registrados pela empresa. Os seis
trabalhadores, encontrados na localidade conhecida como Sítio Pau
D’Arco, área que teria sido arrendada pela pedreira, eram submetidos a
péssimas condições de trabalho.
No momento da inspeção, os trabalhadores encontravam-se em horário de
almoço, cozinhando a própria comida debaixo de árvores em fogueiras
improvisadas. Não havia local para descanso, banheiro ou água potável.
Não havia salário fixo para os trabalhadores, por cada mil pedras
quebradas eles recebiam cerca de R$ 250. Também foi atestado pelos
auditores fiscais do Trabalho a existência de iminente risco de
desabamento de pedras em decorrência da instabilidade do talude. Dentro
do pátio industrial da empresa, máquinas e equipamentos foram
encontrados em situação irregular.
Definição
O
Código Penal define assim o crime de trabalho escravo: “Reduzir alguém a
condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados
ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de
trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão
de dívida contraída com o empregador ou preposto” (artigo 149).
PEC
O
Plenário da Câmara aprovou em maio de 2012, em segundo turno, a
Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 438/01, do Senado, que permite a
expropriação de imóveis rurais e urbanos onde a fiscalização encontrar
exploração de trabalho escravo. Esses imóveis serão destinados à reforma
agrária ou a programas de habitação popular. A proposta é oriunda do
Senado e, como foi modificada na Câmara, volta para exame dos senadores.
A discussão de uma lei futura que defina o que é condição análoga à de
escravo e os trâmites legais da expropriação foi a base do acordo que
viabilizou a votação da proposta. No acordo, está prevista a mudança da
PEC durante a tramitação no Senado, para que ela faça uma menção
explícita à necessidade de regulamentação futura. Caso seja alterada no
Senado, a proposta precisará ser votada novamente pela Câmara.
Informações: ASCOM
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