Foto: Luciene Evans
Gente quero dividir com vocês o poema RETRATOS DO SERTÃO do poeta Celso Cruz que é do Sertão do Seridó no Rio Grande do Norte.
Espero que gostem.
Sou sertanejo e levo vida
Neste mundo atribulado
No muito que tenho andado
De tudo eu tenho visto.
Crença e descrença em Cristo
Sofrimento, desilusão
Artimanhas de patrão
Chuva, seca, enxurrada
Grito, choro, risada
De Tudo vi no Sertão
Alegria, sofrimento
De tudo presenciei
Guardo as coisas que amei
E vi com os olhos da alma.
O silencio da noite me acalma
Me abranda o coração
Me cobre de emoção
Pois vem na minha memória
Pedaços da minha história
Do que vivi no Sertão
Já acordei com o barulho
Do roncar da minha pança
Como é duro ser criança
No meu sertão nordestino.
Sem inverno, o sol a pino
Sem água pra criação
Sem mistura pro feijão
Vejo meu pai buscar melhora
Minha mãe escondida chora
Como é mal este Sertão.
Quando chovia era maravilha
Meu pai voltava e a alegria
reinava no dia a dia
Se vivia com fartura.
Carne, queijo, rapadura
Tinha de tudo e de montão
Engordava a criação
Ganhava cor a açucena
Aí sim, valia a pena
Ser criança no Sertão.
Ao meu Deus eu agradeço
Ele atendeu a minha prece
O sertanejo agradece
E sempre paga a promessa.
Nosso povo a fé expressa
Com um terço em procissão
Também agradeço em oração
Ao senhor, meu São José
Por eu ser forte e ter fé
E ver chover no Sertão.
Carregamos dentro do peito
Orgulho do berço materno
Vivemos de seca a inverno
Construindo nossa história
Cada dia uma vitória
Cada noite uma oração
De terço e vela na mão
Agradeço ao divino
Pedindo ao Deus menino
Pra mandar chuva pro Sertão!
No meu baú de memórias
Revejo o meu passado
Astúcia de namorado
Agarradinho no escuro
Namoro de pé de muro
O fungar de um donzela
O alumiar de uma vela
Uma moleca enxerida
Uma barriga crescida
Um altar e uma capela.
Família constituída
No fim do ano um bruguelo
Hoje crescido, magrelo
De dividir comida pouca
A mãe já com a voz rouca
De gritar vem cá menino!
O outro quis o destino
Abreviar seu sofrer
Inda chego a me abater
Se ouço o tocar de um sino.
Inverno, açude, barragem
Se traduziu em melhora
Ninguém sai mais pro mundo afora
A fartura mora ao lado
Cada um tem seu roçado
E cuida da plantação
E a tal da emigração
Quase mais nunca acontece
Aqui ninguém mais padece
É milagroso o Sertão.
Irmão ajudando irmão
O gado solto no pasto
O conhecimento é vasto
Tem escola lá na vila
A noite nós desopila
A família se mistura
E comemora a fartura
É certo como uma lei
Nós dançar o Boi de Rei
Pra manter nossa cultura.
Tem queijo raspa de tacho
O cantar do curió
O meu avô, minha avó
Cantam uma velha cantiga
O milho enche a espiga
Tá garantido o pão
Vai ser farto o meu São João
Vai ter forró, vai ter quadrilha
Joãozinho já lê a cartilha
Tudo Mudou no Sertão...
Ainda tem umas comadres
Que teimam em ser fofoqueira
Ficam falando asneira
Em todo lugar é assim
Tem gente boa e gente ruim
Outros num tem humildade
Mas quer saber a verdade?
Eu acho uma babaquice
Elas só falam tolice
No fundo nem tem maldade.
É hoje que a vaca tosse!
Dizem pela uma boca só
Hoje a noite tem forró
No armazém de Zé Vieira
E o Deixe de Brincadeira
Vai tocar, forró, baião
Todo tipo de canção
Com fartura e alegria
É assim o dia a dia
Quando chove no Sertão.
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