Depois de receber a Caravana Anti Nuclear que percorreu cidades do sertão pernambucano no período de 29 a 31 de outubro, o município de Itacuruba, uma das cidades que recebeu a Caravana e que é indicada para instalação de uma Usina Nuclear, realizou no último dia 09 a primeira audiência pública para discutir o tema.
Aproximadamente 150 pessoas compareceram à Câmara de Vereadores, local de realização da audiência que contou com forte participação da comunidade, com destaque para intervenção de jovens estudantes de escolas públicas municipais. Se fizeram presentes também representantes do Ministério Público de Pernambuco, Prefeitura Municipal, Fórum Interinstitucional de Defesa da Bacia do Rio São Francisco em Pernambuco, Diocese de Floresta, Povos Indígenas da região, Articulação Popular São Francisco Vivo, Comissão Pastoral da Terra, Irpaa, Comitê da Bacia do São Francisco, além de órgãos que tem desenvolvido estudos e pesquisas na região, a exemplo da Fundação Joaquim Nabuco.
A audiência foi convocada pelo poder público local que diz ter tido conhecimento da possibilidade de instalação da Usina Nuclear em Itacuruba apenas através da imprensa. “O município ainda não foi informado, fiquei sabendo pelos jornais e pelo relatório da Eletronuclear disponível em um blog da região”, declarou o prefeito do município, Romero Magalhães Lêdo (PSB) em sua fala de abertura dos trabalhos.
Antes de abrir para debate, representantes do Fórum Interinstitucional de Defesa da Bacia do Rio São Francisco em Pernambuco – organização que reúne instituições públicas ligadas ao Meio Ambiente – apresentaram características naturais e sócio-econômicas do estado de Pernambuco e em especial dos municípios que estão situados na área que compreende o Sertão de Itaparica. Em seguida, cartazes e gritos de ordem de “Não queremos Usina Nuclear” reforçavam a fala de diversas pessoas que manifestaram a preocupação com os impactos que a instalação de uma Usina Nuclear pode trazer para Itacuruba, para o São Francisco e para o país de forma geral, tomando por referência consequências geradas a partir da geração de energia nuclear em outros países.
Dipeta Tuxá, dos povos indígenas Tuxás de Rodelas (BA), mencionou impactos que a região já sofreu com a construção da Barragem de Itaparica, que muita gente nem acreditava que seria construída. “O governo brasileiro ainda é devedor aos povos dessa região, não devia nem cogitar a instalação de uma Usnina”, lembrou o representante indígena. Alguns questionamentos seguiram no sentido de saber até que ponto a população terá direito à voz e à voto no processo decisório, sendo registrada a proposta de realização de um plebiscito ou referendo, considerando a importância da participação popular nas decisões políticas que afetam diretamente a vida das pessoas.
Por quê Itacuruba?
A cidade de Itacuruba fica às margens do Lago de Itaparica, construído em 1980 no Rio São Francisco, sendo portanto local propício para funcionamento de uma Usina Nuclear que pode precisar de até 60m³/s de água para refrigerar suas turbinas. Além disso, conforme observa o pesquisador João Suassuna, da Fundação Joaquim Nabuco, a região fica próxima ao Raso da Catarina, uma estação ecológica que por ser desabitada pode ser usada para depósito de lixo atômico.
Outro possível argumento é de que Itacuruba possui baixa densidade populacional e a maior parte de seus solos não são mais agricultáveis. Além disso, fica entre os três maiores mercados consumidores de energia elétrica do Nordeste (Complexo Industrial do Recife, Portuário de Suape e Salvador), e já possui linhas de transmissão da Chesf.
Criada em 1963, o município possui 4.369 habitantes (Censo 2010), com uma taxa de urbanização de 84,87% e PIB (Produto Interno Bruto) de 21 milhões, com uma renda per capita de R$ 4,896 (dados de 2008).
As/os moradores, amedrontados com a ideia da Usina no município, apelam para o poder público: “Com 77 anos, o que eu arrumo mais se eu tiver que sair daqui? Cadê os políticos que a gente legeu? Eu peço a Romero [o prefeito] que não deixe a Usina vim pra cá”, expressou emocionada D. Margarida. O professor Deusdedet Maranhão mencionou a necessidade da população ter mais esclarecimento, compreender melhor o tema para opinar e reforçou também a necessidade da população ser ouvida, o que, segundo ele, não ocorreu no caso da Transposição do São Francisco.
Ao final da audiência o prefeito pontuou: “Eu tenho que ter a coerência de nesse momento não ter uma opinião própria, mas fazer a escuta da população e formar minha opinião a partir da opinião da maioria. É uma questão nacional, é o povo brasileiro que tem que se rebelar contra a instalação de uma usina”. Segundo o chefe do executivo, a polêmica maior é em função do acidente ocorrido no Japão no início deste ano, mas a discussão não deve girar em torno da energia ser alternativa para o país, mas sim “temos que discutir o desenvolvimento integrado da região de Itaparica”, finalizou.
De acordo com o Promotor de Meio Ambiente, André Silvani, do Ministério Público do Estado de Pernambuco, todas as manifestações foram registradas em ata, a qual será utilizada para os devidos encaminhamentos. Silvani, no entanto, destaca que de acordo com a legislação de Pernambuco uma Usina Nuclear só poderá ser instalada no estado quando todas as fontes de energia forem esgotadas.
Colaboração do texto e foto: Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada
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